terça-feira, 1 de novembro de 2011

O que é Globalização- L.Fernando Veríssimo

QUE É GLOBALIZAÇÃO ? *
SIMPLESMENTE FANTASTICA A DEFINICÂO
Pergunta: Qual é a mais correta definição de Globalização?

Resposta: A Morte da Princesa Diana..

Pergunta: Por quê?

Resposta: Uma princesa inglesa com um namorado egípcio, tem um acidente de
carro dentro de um túnel francês, num carro alemão com motor holandês,
conduzido por um belga, bêbado de whisky escocês, que era seguido por
paparazzis italianos, em motos japonesas. A princesa foi tratada por um
médico canadense, que usou medicamentos americanos. E isto é enviado a
v ocê por um brasileiro, usando tecnologia americana (Bill Gates) e
provavelmente, você está lendo isso em um computador genérico que usa
chips feitos emTaiwan e um monitor coreano montado por trabalhadores de
Bangladesh, numa fábrica de Singapura, transportado em caminhões
conduzidos por indianos, roubados por indonésios, descarregados por
pescadores sicilianos, reempacotados por mexicanos e, finalmente, vendido
a você por chineses, através de uma conexão paraguaia
Isto é,

*GLOBALIZAÇÃO!!!*


QUEM SOU EU?

Nesta altura da vida já não sei mais quem sou...
Vejam só que dilema!!!
Na ficha da loja sou CLIENTE, no restaurante FREGUÊS, quando alugo uma
casa INQUILINO, na condução PASSAGEIRO, nos correios REMETENTE, no
supermercado CONSUMIDOR.
Para a Receita Federal CONTRIBUINTE, se vendo algo importado
CONTRABANDISTA. Se revendo algo, sou MUAMBEIRO, se o carnê tá com o prazo
vencido INADIMPLENTE, se não pago imposto SONEGADOR. Para votar ELEITOR,
mas em comícios MASSA , em viagens TURISTA , na rua caminhando PEDESTRE,
se sou atropelado ACIDENTADO, no hospital PACIENTE. Nos jornais viro
VÍTIMA, se compro um livro LEITOR, se ouço rádio OUVINTE. Para o Ibope
ESPECTADOR, para apresentador de televisão TELESPECTADOR, no campo de
futebol TORCEDOR.
Se sou corintiano, SOFREDOR. Agora, já virei GALERA. (se trabalho na
ANATEL , sou COLABORADOR ) e, quando morrer... uns dirão... FINADO,
outros... DEFUNTO, para outros... EXTINTO , para o povão... PRESUNTO... Em
certos círculos espiritualistas serei... DESENCARNADO, evangélicos dirão
que fui... ARREBATADO...
E o pior de tudo é que para todo governante sou apenas um IMBECIL !!! E
pensar que um dia já fui mais EU.

Luiz Fernando Veríssimo.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Mário " Grande" Quintana

Todos estes que aí estão.
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho.

domingo, 25 de setembro de 2011

Poema de Simone Vargas Mombach

Sem Título

Já acertei e errei, adoeci e me curei.
Já pedi e implorei. Já cedi, vendi e dei.
Já me culpei e me torturei por tantas coisas que nem sei.
Já corri muito atrás mas era longe demais e não consegui chegar.
Já rasguei lembranças que não prestavam mais.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

OFICINA DE CONTOS NO SESC

Divulgamos a Oficina Criativa de Contos realizada na Unidade do Sesc Gravataí no período de 21 a 23 de setembro/2011
Local: Sala Multiuso so Sesc
Rua Anápio Gomes, 1421 4º andar
Horário: 19h às 22h
Ministrante: Cintia Moscovich

A proposta é desenvolver a escrita criativa e a sensibilização para o texto, além de trabalhar exercícios de escrita de contos e minicontos com o emprego dos diferentes tipos de narradores e perspectivas narrativas, além de técnicas de desbloqueio e de percepção do texto.

* A oficina é gratuita, maiores informações no fone 34976216.

domingo, 28 de agosto de 2011

Leitura Gratuita - Contos Urbanos - Conto 4 " João coração de Criança "



Em uma casa na beira da estrada RS 20 no distrito de Itacolomi, vivia João, um menino de doze anos com muitos sonhos em seu pequeno coraçãozinho. De uma família pobre, João nunca teve nenhum luxo em sua casa. Nem brinquedos comprados em lojas. Brincava com bonecos feitos de galhos de árvore: os mocinhos não tinham casca e os bandidos eram os mais cascudos. Às vezes, seu pai fazia alguns carrinhos de lata de azeite e rodinhas de cabo de vassoura. João guardava esses carrinhos para brincar quando alguém viesse visitá-lo. Nos dias normais, brincava com seu trem de rolos de latas cheias de areia. Aprendeu, desde cedo, a nadar, costumava se refrescar no riacho que cruzava parte do terreno da pequena chácara, que a família mantinha.
Filho único, João tinha também como companhia a Carijó, pequena garnisé que ele ajudou a sair do ovo e, desde então, não saiu mais de sua volta. Tinha o Alarido, canário da terra que seu pai trouxe da cidade para alegrar João com seu canto. Mas João não tinha ainda se acostumado a ver Alarido engaiolado. Dava nó na garganta. Mas seu pai nunca soube disso. João jamais iria desapontar seu pai por algum motivo. Fosse o que fosse. Mas a maior companheira de João era a Dolli, cadelinha Fox, mestiça que apareceu por lá quando ainda era bebê. João cuidou da bichinha com tal zelo que ela passou a fazer parte da família.
Dolli. Assim mesmo. Com dois eles. João repreendia quem não falasse o nome certo. Dol-li, esticando um pouco o ele.
Dolli era muito educada. Nem precisou ensinar. Ela trouxe educação do berço. Não latia dentro de casa, pedia para sair quando precisava fazer as necessidades e, quando queria algo para comer, sentava com as duas mãozinhas para cima e olhava com cara de pidona. João e Dolli se entendiam só no olhar. Quando João estava triste, Dolli ficava ao seu lado, triste também, até João melhorar. Então, corria em volta de si mesmo, dando saltos enormes. João acreditava que era para festejar.
Os amigos da escola onde João estudava não eram muito de brincar com ele. Nenhum dos cinco. João era muito tímido. Não ficava à vontade com outras pessoas, que não fossem os de casa. Para conversar com João, só depois de conviver com ele mais de ano. Até lá, era melhor se acostumar a ter um parceiro que não abria a boca para nada. As respostas obtidas de João não passavam de monossílabos. Então, seus amigos preferiam os mais agitados, menos inibidos.
Menos Rosa. Rosa não era como os outros da escola. Ela tinha um olhar diferente para João. Deixava-o mais encabulado do que qualquer outra coisa. Rosa era a mais bonita, a mais educada. Isso aos olhos de João. Já o Marreco, o maior da turma, não concordava com isso. Para ele, Rosa era uma guria para se pegar atrás da igreja, que ficava ao lado do colégio. Um dia, em uma festa de São João, depois de comer muita pipoca e tomar litros e mais litros de suco de uva, João foi “desaguar” atrás do matinho, e, para seu espanto, lá estava Marreco tentando pegar Rosa na marra. João teve até corte na urina. Ficou olhando sem saber direito como agir. Sua vontade era de bater em Marreco até o fazer cacarejar igual à Carijó. Mas, e a coragem? Marreco dava dois dele na altura e, embora magrão era bem mais forte. Mas o que segurava João não era medo; era o risco de fazer feio na frente de Rosa. Se Rosa não estivesse ali, azar.
Ao ver que João estava parado olhando para os dois, segurando o “pintinho” pela cabeça, Marreco começou a rir e esqueceu Rosa, que aproveitou e se mandou para dentro da barraca de seu pai. João também foi esperto o suficiente para correr enquanto Marreco piscava. Naquela noite, João não dormiu direito pensando, todo orgulhoso, no fato de ter salvado Rosa. Sim, mesmo que daquela forma meio fora de script. O fato é que a presença de João ali, naquela hora, salvou Rosa e isso bastava para inflar seu peito e fazê-lo suspirar espantando o sono para longe do mundo dos apaixonados.
Seu Tião, da quadra de areia, gostava muito da companhia do guri. João, de vez em quando, ajudava seu Tião a organizar a quadra para os times que jogavam à noite. Tinha também as “pingas” que deveriam ser colocadas de molho na bacia de pedra onde passava a água da vertente. A “pinga” ficava bem geladinha; os jogadores adoravam.
Um dia, apareceu uma escola de outra cidade para um torneio na quadra de seu Tião. Foi uma correria só para organizar tudo. Na última hora, faltou gente para completar os times. Seu Tião não teve dúvida; botou uma camiseta de futebol em João e encaminhou o guri para se posicionar na quadra. João sentiu-se o verdadeiro Rei Arthur. Aquilo não era camiseta: era uma armadura. Agora ninguém podia com João. Ele seria invencível com aquela camiseta de jogador de futebol de quadra de areia. Mas o futuro de João não estava na bola. Iniciou o jogo e, na primeira dividida, a bola espirrou e um adversário chegou antes do João e, graças à falta de qualidade dos craques adversários, o sujeito meteu o pé na pelota de qualquer jeito. A bola subiu e levou o nariz de João junto para o céu. João tentou abrir os olhos, mas a areia não permitiu. Foi um verdadeiro pandemônio. A turma do time do João queria vingança. A turma do time adversário queria desculpas, e seu Tião queria acalmar a todos. No final, deu tudo certo: o juiz expulsou o agressor, que, na verdade, era inocente, e João não teve condições de continuar na partida. Assim, os times ficaram parelhos e o jogo prosseguiu. Naquele dia, seu Tião levou João para casa e se desculpou com sua mãe pelos ferimentos do guri.
O ferimento não foi dos piores, mas, somado a um pouco de manha, levou João a ficar de cama com o nariz inchado. Não saiu de casa para brincar o dia inteiro. Não foi para a escola, fazendo com que todos se perguntassem onde estava o “tampinha”. Dolli não saiu do quarto de João, nem para comer. Foi preparado um prato para Dolli e colocado ao lado da cama de João. Quando estavam a sós, João conversava animadamente com Dolli e contava a ela os segredos de seu coração, entre os quais estava Rosa. Sempre que falava de Rosa, João, instintivamente, olhava para cima. Dolli também olhava e tentava ver no rosto de João o que ele via lá em cima, pois ela não via nada e não entendia essa expressão humana de pedir, em silêncio, ajuda aos deuses, olhando em sua direção.
Após almoçar, João ficou deitado, lendo a história de Robson Crusoé. Ele adorava o personagem Sexta-Feira. Sua mãe o chama, pois havia chegado visita. João levantou e foi à sala. Lá estava Rosa, em todo o seu esplendor. Usava uma blusa vermelha, que João adorava – tinha as mangas fofas e dava certo ar de império. Mas o que João gostava mesmo era dos joelhos de Rosa. Eram lindos, redondinhos, moreninhos. Quase nem tinham marcas, aquelas de ficar ajoelhada escovando o assoalho de madeira, para depois passar a cera quente. Rosa ajudava bastante sua mãe, mas quase não tinha marcas nos joelhos. Ela sempre usava as saias um pouco acima do joelho, para delírio dos guris da escola.
Rosa ficou a tarde inteira com João. Ele quase não acreditou. A cada movimento de Rosa, achava que ela iria se levantar e se despedir, mas não. Ficou até à tardinha. Conversaram muito. Quer dizer, Rosa falou muito, e João ouviu muito. Tomaram suco de laranja colhida na hora com bolacha sortida que sua mãe preparou. Brincaram embaixo das laranjeiras, na área da frente e molharam os pés no riacho. João tinha a nítida impressão de que Rosa estava ali para outra coisa. No fundo, ele sabia que ela gostava dele mais do que dos outros guris, mas João não conseguia ultrapassar as barreiras de sua timidez. Se Rosa ficasse assim ao seu lado, sem falar nada, João até arriscaria lha tacar um beijo. Mas, e depois? O que fazer depois do beijo? Se ela gostasse e quisesse mais, o que iria acontecer? E se ela saísse correndo e ficasse de mal? Não, melhor esperar. Talvez ele estivesse errado. Talvez ela estivesse ali apenas por solidariedade. Melhor deixar assim, na amizade mesmo. Rosa se despediu de João segurando suas mãos sem querer soltar. João foi suando frio e tremendo de um jeito que não teve solução senão arrancar as mãos dele de dentro das dela num puxão só e botar para trás das costas. João estava apavorado com aquela situação. Sabia o que ela queria. Mas não tinha condições para atendê-la. Depois que Rosa foi embora, João ficou se culpando e praguejando. Claro que se fosse o Marreco, Rosa já estaria peladinha atrás das laranjeiras. Odiava-se quando pensava assim. Não conseguia fazer nada, senão deitar em posição fetal, com Dolli ao seu lado até a dor passar.
No colégio, João não conseguia olhar Rosa nos olhos. Parecia que ela o estava cobrando pelo fracasso do dia anterior. Mas o pior estava por vir. Marreco, esperto e muito mais vivido que os dois, percebeu os olhares de Rosa para João e a timidez de João. Em uma saída rápida da professora da sala de aula, Marreco se levanta e começa a gritar para todos que Rosa estava gostando de João e que João era bebezinho demais para Rosa. João queria morrer de vergonha. Rosa não deixou barato, levantou-se e jogou tudo o que estava a seu alcance para cima de Marreco. Nesse instante, a professora entrou e todos voltaram aos seus lugares. Rosa estava chorando e a professora deixou-a ir embora mais cedo. João, com o coração querendo pular fora do peito, imaginava o que faria com Marreco quando terminasse a aula. Em sua imaginação, ele sempre vencia. Havia uma em que ele corria na frente e esperava o Marreco em cima do barrancão. Quando Marreco passasse, ele pularia em cima dele e, já com a vantagem do tranco da queda, montaria em sua barriga e bateria tanto até Marreco pedir desculpas, e todos vibrariam com sua bravura, carregando-o nos ombros. Claro que depois a notícia se espalharia e Rosa chegaria à sua casa novamente para visitá-lo, porém, dessa vez, eles namorariam no riacho dos fundos.
Ele poderia, também, já na saída da aula, chamar Marreco para briga, ali, na frente de todos. Ele sabia que os colegas não gostavam de Marreco e ficariam ao seu lado. Jogaria os livros para o lado, arremangaria a camisa e, embora Marreco estivesse rindo nessa hora, ele se jogaria furioso em cima do outro que, surpreso, não teria tempo de reagir e cairia ao ser atingido por uma cabeçada na barriga, já que no rosto de Marreco João não alcançaria se os dois estivessem em pé. Nessa versão, Rosa ainda estaria ali com eles e ficaria entusiasmada com sua bravura, dando-lhe um beijo na frente de todos e, a partir dali, todos os respeitariam mais, inclusive Marreco.
Os devaneios de João continuaram até a hora da saída. O coração acelerou mais ainda. Já fora da sala, no caminho de casa. Marreco se lembrou dos olhares e iniciou um coro de “Bebezinho” que se estendeu até João entrar em seu pátio de cabeça baixa.
João foi para os fundos do quintal e sentou-se na terra arenosa riscando, no chão, corações com seu nome e o dela.
Acordado de seu sonho por sua mãe, João apagou rapidamente com os pés os desenhos que fizera. Estavam chamando João para brincar de polícia-ladrão. João foi meio cabisbaixo. Ao avistar a turma, percebeu que Marreco não estava, e Rosa era a primeira da fila. Ao separar os ladrões da polícia, Rosa foi ladra e João foi polícia. Escolhido o ponto onde seria a cadeia, iniciou a brincadeira e os ladrões saem correndo desesperados para não serem pegos. João dá uma olhada em volta e vê Rosa dobrando a rua do riacho e ninguém atrás dela. Ele dá um salto e larga em disparada, cortando caminho por um terreno baldio para poder interceptar a ladra antes que ela atingisse a zona neutra. Rosa corria e olhava para trás, quando percebeu que João estava atrás dela. Rosa entrou em um capinzal que dava em sua cintura, diminuindo sua velocidade. João chegou mais perto e, para não perder a presa, se jogou em seus pés, abraçando os joelhos que tanto adorava. Rosa caiu com João agarrado em suas pernas. Após um minuto de reflexão, levantaram os dois. João pegou firme no pulso de Rosa, para que a ladra não fugisse, e deu voz de prisão.
— Teje presa!
Rosa sorriu e, quando João iniciou sua jornada de volta, Rosa trancou os pés. João olhou assustado para a guria, que firmou seus grandes olhos negros bem dentro dos olhos de João e, chegando bem perto do guri, fazendo-o sentir sua respiração, falou sem medo:
— Me dá um beijo.
Nessa hora separam-se os homens dos guris, os vividos dos inocentes. João, guri inocente, tímido, de vida simples, não estava preparado para a vida. Não estava preparado para o amor que insistia em brotar em seu coração. O mundo caiu em sua cabeça. Ficou aturdido, não conseguia pensar. Seu coração lhe batia nas têmporas e João sentiu suas pernas fraquejarem. Seus olhos se encheram de lágrimas, fazendo Rosa, que aguardava seu beijo, marejar também os seus. João sabia que seu grande primeiro amor estava fugindo dele por sua culpa, mas não pôde atender ao pedido de Rosa. Sua timidez era fatal e o aniquilara diante de um pedido de sua amada. João só pôde dar uma resposta
— Tu tá presa, já falei! Vamos pra cadeia.
O caminho até a cadeia foi longo por demais. Longo para João que não via a hora de largar a mão de seu grande amor para se enfiar em seu travesseiro e tentar responder às velhas questões que assombravam seu coração de criança. Por que sentia? Se não sabia o que fazer com seu sentimento?
Também foi longo para Rosa, que não entendia onde tinha errado. João não estava assim tão apaixonado por ela como ela havia pensado? E agora, para piorar, vai achar que ela é fácil demais. Acabou. Definitivamente acabou sua chance de conquistar seu amado. Ficaria, ela, à mercê de caras como Marreco? O que seria dela a partir de hoje?
No dia seguinte, Rosa não foi à aula. No outro, também não, nem no outro. Depois se soube que ela tinha mudado de cidade. Ninguém mais a viu. Talvez uma coincidência que a livrou de ver João todos os dias. De ter que sofrer uma rejeição todos os dias. Seria demais para ela. Feliz coincidência.
João continuou assistindo às aulas, mas não era o mesmo. Não brincava mais, falava menos ainda. Sua mãe o levou ao médico várias vezes, mas não descobriu o que o guri tinha. Era só tristeza, mas não sabiam o motivo. João estava sofrendo a pior dor de amor que há: a da incapacidade de enfrentar seus medos, impostos pela timidez. João, no fundo, sabia que aquilo um dia ia passar. Ele iria crescer e, certamente, iria conhecer outras gurias e que, talvez, soubesse como agir. Parte de sua timidez foi embora com Rosa a quem ele será eternamente grato, pois lhe ensinou uma lição que custou muito caro para os dois. Custou-lhes o primeiro grande amor. Jamais iriam esquecer. Um sofrimento que os preparou para outros grandes amores e que, certamente, lhes trarão muita felicidade.

Fim

sábado, 13 de agosto de 2011

Leitura Gratuita - Contos Urbanos - Conto 3 " Alagados "


Paulinho, um guri de dez anos, muito esperto para sua idade, mora em uma das bacias nascidas de acidentes geográficos em São Pedro do Caiaque. Nunca saiu daquele lugar, por sua família não ter condições financeiras e por falta de necessidade. Não tem muitos amigos, dá para contar nos dedos das mãos. Espera, um dia, poder usar os dedos dos pés também, o que certamente acontecerá logo, pois é um guri muito simpático, prestativo e inteligente.
Aos domingos à tarde, Paulinho se reúne com a turma para uma pelada no morro – único lugar plano e muito elevado em relação ao resto do lugar – O problema é quando a bola cai lá embaixo. Ninguém quer buscar. Os times ficam empurrando a responsabilidade, sempre querendo que o melhor jogador do time adversário vá buscar a bola. Assim, quando o adversário chega de volta, está sem pernas para o jogo, enfraquecendo o time. Chegaram a criar uma regra nova. Só vai buscar a bola alguém do time que está ganhando, para que o jogo fique mais equilibrado e, conseqüentemente, mais competitivo. Diante dessa nova regra, Paulinho passou a integrar o time principal do bairro, que ganhava quase todos os jogos. Não que ele seja, assim, tão bom de bola, mas é muito rápido para executar qualquer tarefa. Fica sempre na reserva e, quando a bola desce a ladeira, lá vai Paulinho correndo ladeira abaixo. Depois de buscar a bola algumas vezes, o capitão sempre lhe permite jogar alguns minutos. Mesmo porque ele já está cansado e não pode comprometer a eficiência dos companheiros de time. Paulinho corre a passos lentos para lá e para cá. Quando lhe passam a bola, encosta outro jogador de seu time e fica a menos de dois metros insistindo para que lhe passe a bola. Não podem arriscar um passe longo vindo de seus pés. Tudo para facilitar a vida do guri. Paulinho sabe disso tudo, mas não se importa. Deixa-se levar.
Zeca Chinelo é o maior amigo de Paulinho. Foi ele quem conseguiu uma vaga para o guri no time. Chinelo é bolero respeitado. Não sabia que o capitão queria Paulinho só para buscar a bola. Ficou indignado com a atitude do time. Chegou a ameaçar sair do time caso não fosse revista essa decisão. Chinelo é dono de um drible que lhe garantiu o apelido do mesmo nome. Seu drible deixa o adversário sem saber onde está. Sempre que ele aplica o “chinelo”, a galera grita em coro:
— Chinelada!
Só então o adversário percebe que foi vítima de mais um “chinelo” do Zeca Chinelo.
Domingo, dezesseis de março, Paulinho está na frente de sua casa esperando Chinelo passar e subirem a ladeira para mais um jogão de bola. Chinelo estava demorando muito. Paulinho ficou com medo de se atrasar e foi sozinho. Depois, explicaria para o Chinelo, que não iria se importar, com certeza. Da casa de Paulinho até o campo da ladeira, levam-se uns quarenta minutos, mas há alguns guris que vêm de mais longe ainda.
O jogo está prestes a começar quando o tempo fecha, as nuvens parecem estar a poucos metros de suas cabeças. Os guris saem correndo ladeira abaixo. Paulinho se lembra das recomendações de sua mãe.
“Se chover e tu estiver lá em cima, espera a chuva passar para descer. A ladeira fica muito escorregadia quando está chovendo. É muito perigoso”.
Paulinho busca abrigo na cabana de galhos que construíram para se abrigarem do sol e da chuva, quando era pouca. Pela cara do tempo, a chuva não seria qualquer coisa. Foi o céu mais apavorante que Paulinho já tinha visto. Em menos de meia hora, anoiteceu em todas as direções. O vale onde ficava a vila estava parecendo um grande caldeirão, com pessoas correndo de um lado para outro buscando abrigo. Com o peito apertado, Paulinho sofria na dúvida: descer ou ficar lá em cima? Se a chuva, que parecia ser das brabas, o pegasse no meio da descida, seria o caos. Mas, se ventasse muito forte e o abrigo não resistisse, ficaria à mercê dos raios, que eram muitos na região. Antes de Paulinho decidir o que fazer, caiu a maior tromba d’água já registrada no lugar. O guri olhou em volta e só enxergava água, muita água. Tentou ver como estava a vila lá embaixo, mas já não se podia ver mais nada. Apenas um grande tapete embranquecido. Sentiu-se no céu. Acima das nuvens. Correu para o abrigo, mas não deu tempo de chegar. O vento forte arrastou a cabana até a beira da ladeira e ela sumiu ladeira abaixo. Paulinho já não sabia onde se esconder. Seus pensamentos iam de casa, sua mãe, até a casa de Chinelo e seu irmãozinho de colo. Ele pensava se tinha dado tempo de os colegas de time chegarem em casa, pois a chuva era muita. Mal podia levantar a cabeça para enxergar onde pisar. Os pingos d’água castigavam seus olhos. Analisou de onde vinha o vento para esconder o rosto, mas as revoadas não tinham direção certa. Parecia que vinham de todos os lados. Prestando bem atenção, percebeu que tinha um lado onde o vento era mais forte. Foi, então, na direção do barranco para se proteger do vento que insistia em querer arrastá-lo. Procurou cuidadosamente um lugar seguro e se agachou. Encolheu-se o máximo que pôde para se proteger. Com o rosto coberto com a ponta da camisa, fechou os olhos e aguardou até a chuva passar.
Depois de algum tempo, a chuva foi acalmando lentamente e o vento amenizou. Paulinho abriu os olhos e deu de cara com um cachorro vira-latas que estava encolhido ao seu lado. O pêlo amarelado e um pouco comprido. Estava todo arrepiado pela água que caiu. Paulinho ficou um tempo olhando para o seu novo companheiro sem saber se deveria correr ou agradar seu vizinho de barranco. Percebeu, pela cara do cão, que ele não era do mal. Sentiu que podia confiar no cachorro. Esticou a mão e o bicho se aproximou lentamente e lambeu as pontas de seus dedos.
— Vou te chamar de Temporal. Isso se não aparecer teu dono. De onde tu veio? Como chegou aqui em cima com toda aquela chuva?
Paulinho, ao falar da chuva, estende o olhar para a vila e sente um grande medo como nunca havia sentido. A água estava cobrindo as casas. Só se enxergavam os telhados. Percebeu, então, que Temporal subiu no morro para fugir da enchente. Ouvia, ao longe, os gritos dos moradores, pedindo e oferecendo ajuda; procurando, entre os escombros se havia alguém perdido; chamando para cima das jangadas de tábuas arrancadas das casas.
— Mãe!... Vem Temporal! Vamos descer.
Temporal relutou em descer o morro. Não queria se meter no meio da água. Penou muito para escapar e agora estava ali, prestes a voltar. Andava de um lado para outro sem coragem de descer o barranco que dava para o caminho. Paulinho subiu e pegou-o no colo. Desceu a ladeira com toda a experiência de já ter buscado mais de vinte bolas lá embaixo.
Quanto mais se aproximava da enchente, os gritos iam aumentando. O desespero das pessoas ia ficando cada vez mais assustador. Paulinho tentou entrar na rua onde morava, mas não conseguiu. A água estava na altura de seu peito e, de repente, lhe veio à boca. Com muita dificuldade e com ajuda de Temporal, conseguiu voltar para a parte rasa. Olhava para todos os lados, buscando enxergar um caminho que desse pé para chegar à sua casa. Gritava por sua mãe, mas seu grito pequeno de criança se perdia no meio de tanta lamúria. Uma moça ia passando apoiada em uma porta de casa que boiava no grande rio, que se transformou a rua principal do vilarejo. Chamou Paulinho para que subisse na porta, agora barco. Paulinho jogou Temporal em cima da porta e tentou subir. Mas, quando se apoiou, a moça tentou ajudá-lo e o peso dos dois emborcou a porta derrubando Temporal e tirando as chances de Paulinho sair dali.
Ao lado, assistindo a tudo, estava uma mãe, abraçada a uma guriazinha de três anos, que tremia feito vara verde. Enrolada apenas em um cobertor totalmente encharcado. A guria repetia freneticamente, “mamãe, mamãe, mamãe” e a pobre mãe, sem saber o que fazer, apenas acariciava a cabeça de sua filha. Com as lágrimas caindo sobre os cabelos molhados da pequena.
Paulinho buscou um barranco um pouco mais alto e sentou-se. Ficou observando o que acontecia à sua volta e pedia, em silêncio, sem saber a quem, para que sua mãe estivesse bem. Levantou os olhos, enxergou seu Tomé, do mercado, e gritou com todos os seus pulmões. Seu Tomé estava empurrando um estrado com duas senhoras de muita idade e algumas crianças de colo dentro. A água estava na altura de seu pescoço. Mas seu Tomé não se importava com os goles que, de vez em quando, tinha que tomar em sua empreitada. Gritava para todos, para que fizessem o mesmo.
— Tem mais estrados no mercado. Peguem o que for preciso, mas socorram os velhos e as crianças. Vamos levar para a parte mais alta.
A parte mais alta era onde estava Paulinho. Diante do que ouviu, ficou quieto esperando. Logo em seguida, chegou seu Tomé para descarregar seu estrado.
— Seu Tomé! O senhor viu minha mãe?
Seu Tomé olhou para o rosto de Paulinho, sujo e apavorado.
— Como é que tu chegou aqui, guri? Tua mãe está do outro lado. Ela está bem. Mas tu não pode sair daqui. Pelo menos por enquanto. Fica aqui, que tenho que buscar mais pessoas que estão ilhadas nos telhados das casas.
Seu Tomé empurrava o estrado até certa altura da rua e ajudava outras pessoas, que remavam até o local mais baixo, onde os moradores estavam nos telhados aguardando ajuda sempre gritando e organizando a ação das pessoas.
Temporal late muito em direção aos escombros que passam flutuando na correnteza. Paulinho tenta acalmá-lo, mas o bicho está muito inquieto. Temporal escapa das mãos de Paulinho e avança em direção a um amontoado de tabuas e tecidos que flutuam até ficarem presos a um poste. Temporal não pára de latir, atira-se na água e nada até os escombros. Sobe no monte retorcido e mete a cabeça em meio às tábuas. Paulinho assiste a tudo ansioso, Temporal puxa uma trouxa e se ouve o choro fraco de um bebê. Paulinho grita desesperado para todos os que estão à sua volta.
— Tem um bebê ali, tem um bebê ali. Moço! Tem um bebê ali.
Puxa a camisa de um senhor que está ajudando a recolher as pessoas idosas. O homem corre até os escombros e, com a água acima da cintura, vai até onde está Temporal. Com aquele movimento e a gritaria de Paulinho, vieram outras pessoas para ajudar. Logo eram mais de seis em volta do monte de entulhos. Uma senhora sai com a criança nos braços e a coloca no chão, ao lado de Paulinho, para desenrolar os lençóis que estavam quase sufocando o bebê. Ao desenrolar o bebê, Paulinho reconhece o irmão de Zeca Chinelo. Dá um salto e corre para os escombros. Tenta entrar na água gritando Zeca! Zeca! Zeca! Temporal continua latindo e fuçando o monte de entulhos. Late e levanta a cabeça olhando para Paulinho que está quase se afogando tentando chegar até ele. As pessoas que estavam por ali conseguem chegar até Paulinho e o tiram da água. Um pouco aturdido, ele grita a todos:
— Vocês precisam tirar o Zeca dali! Ele está ali. Tira ele! Tira!
— Calma guri! Do que tu está falando?
— Esse bebê é irmão do Zeca, meu amigo. Acho que aquela é a casa dele. Tira ele de lá.
O homem olha espantado para Paulinho que está olhando fixo na direção dos escombros, quando o homem levanta a cabeça e percebe Temporal correndo em cima das tábuas, latindo sem parar, sai correndo aos gritos.
— Tem mais gente nos escombros. Venham ajudar! Aqui! Aqui!
Logo são dezenas de braços a retirarem as tábuas do meio da água. Paulinho chama Temporal para dar mais espaço às pessoas que, incansavelmente, tiram tábua por tábua que sobraram do que, um dia, foi uma casa.
— Silêncio, silêncio. Ouçam! Tem alguém lá embaixo.
Rapidamente, retiram mais algumas tábuas e percebem uma caixa de isopor flutuando no meio dos escombros. Zeca está com a cabeça dentro da caixa emborcada, onde pôde se manter respirando até que alguém o encontrasse. As tábuas que estavam por cima não permitiam que ele saísse sem ajuda. Paulinho sorria em meio a prantos quando tiraram o amigo e o puseram a salvo fora da água.
— Agradeça ao teu amigo. Ele salvou tua vida.
— Não fui eu. Foi o Temporal.
— Vem cá Temporal. Te devo uma.
— Teu irmão está ali, com aquela senhora. Onde está tua mãe?
— Não sei. Ela saiu para ir ao mercado e eu fiquei com o bebê. Ela demorou demais. Por isso me atrasei para o jogo. Depois começou a chuva e... Foi isso aí.
— Zeca, me ajuda a encontrar minha mãe. Ela está do outro lado.
— Não tem como chegar lá. As pessoas estão vindo de lá para cá, porque lá está muito cheio. Vamos esperar e ficar cuidando quem chega. Ela virá para cá. Vamos esperar.
Paulinho e Zeca Chinelo ficam ao lado da senhora que está com o bebê e se aproximam para se proteger da chuva, agora mais fraca. Paulinho olha em volta. As pessoas estão com suas roupas viradas em farrapos. Os rostos irreconhecíveis por causa da lama. Os adultos gritam, se agitam e recolhem o que podem salvar para que a água não arraste tudo. Uma visão que não sairá mais de sua mente. Avista seu Tomé ao longe, arrastando mais um estrado cheio de gente. Dessa vez, está sendo ajudado por mais dois homens que puxam as cordas enquanto ele empurra. Seu Tomé, grande herói. Quantas pessoas ele tirou da água! Quantas senhoras vão poder abraçar novamente seus netos. Graças ao Seu Tomé, que sequer sabe o nome delas. Mas não importa. É uma vida que precisa ser salva e isso tem que ser feito a qualquer preço. No estrado, estavam as mães de Paulinho e Zeca, que correram emocionadas para dar mais um abraço em seus filhos. A água foi baixando lentamente, enquanto todos esperavam pacientemente sentados na parte mais alta. Os rostos sofridos pelas perdas preparavam-se para enfrentar a lama que estava por vir. Sabiam que teriam muito trabalho pela frente, mas podiam contar uns com os outros. Todos, unidos, sairiam vencedores, seguindo o exemplo de Seu Tomé.

Fim




terça-feira, 28 de junho de 2011

Apelo ( Vencedor do concurso "Poemas no Ônibus" )

Apelo


Senhores do mundo
Não busquem as respostas
Em seus livros de capas brilhantes
Nem nas mentes dos que se dizem
Donos do saber.
Lembrem da Dona Maria de Lourdes,
Simplicidade que vem de berço
Transmitida a todos que querem ver,
Pouco estudo, mas muito saber,
Saber da vida, de ensinar a viver,
De matar a fome dos filhos com palavras,
Saber da paciência de esperar o amanhã
Na crença que será melhor,
Quando se for, ela não terá manchetes em jornais,
Não aparecerá na televisão, nem terá muita repercussão,
Mas estará eternizada onde mais importa,
No coração de uma pequena parte da nação.

Faustino Alves Filho

Obrigado Senhora Maria de Lourdes ( Minha Mãe )

terça-feira, 7 de junho de 2011

Leitura Gratuita - Contos Urbanos - Conto 2 " Tito Rosa e o Enforcado "

— Dá licença de me aprochegar ao seu lado, moço? O senhor é novo na cidade, não é? Bota uma pra eu, Zezinho. Soube que o moço está procurando Tito Rosa para negociar umas vaquinhas. Deixa eu lhe contar um causo.
Tibúrcio Eulestério Fragato de Moraes Peixoto. Esse é o nome de batismo de Tito Rosa.
Tito porque sua mãe, Dona Maria Eufrasina Fragato de Moraes Peixoto ou apenas Dona Nina, conta a lenda, era muito preguiçosa. Competia com as lesmas que subiam nos pilares de tijolos maciços da velha casa de madeira e, às vezes, as lesmas ganhavam. Chamava o guri de Tito, de preguiça de falar o nome todo. Bem, Dona Nina chamou Tito Rosa pelo nome completo apenas uma vez, por decepção. Foi quando ele teve que buscar o Medonho no campo, cavalo de carroça que ajudava no sustento da família. Antes desse episódio, era só Tito, depois passou a ser chamado por todos de Tito Rosa. Menos na sua frente, claro. Os poucos que deixaram escapar “Tito Rosa” na frente do moleque aumentaram a conta bancária do Dr. Laurino, o dentista da cidade.
Acontece que, no caminho para o campo onde estava Medonho, morava a Rosinha, que, até então, tinha como sobrenome Fagundes Alves da Silveira e, depois do acontecido, passaria a se chamar Dona Rosa Fagundes Alves de Moraes Peixoto. Acho que mais três gerações dessas e vai faltar linha para assinar tanto nome.
Voltando pro acontecido, no caminho entre a casa de Tito e o campo onde ficava Medonho, estava Rosinha, guria formosa. De chiquinha e tudo. Usava até chinelos, que a mãe havia feito. Sabia ordenhar a Preta, vaca leiteira muito da boa. Tinha até sardas nas bochechas. A Rosinha, não a vaca. Que bochechas lindas as da Rosinha! Sempre que Tito tinha a oportunidade, aproveitava para passar na casa da Rosinha. Se conheciam das festas de São João e das Quermesses. Tito sempre teve vontade de pegar na mão da guria, mas lhe faltava coragem. Naquele dia não. Ele saiu de casa decidido. Ainda mais que foi a mãe que mandou ele praqueles lados. Não tinha nem o peso na consciência de ter desviado o caminho.
Rosinha estava estendendo roupa no lado da casa. Seu vestidinho de chita de bolinhas deixava ver um “naquinho” das coxas, sempre que ela esticava os braços para estender as roupas que ela mesmo lavava na sanga que tinha no fundo da chacrinha. Rosinha tinha os braços firmes, de tanto esfregar roupa. O resto também devia de ser. Tito ficou observando Rosinha por um bocado de tempo. Até a guria perceber. Dava certo charme ser flagrado na observância. Rosinha não era nenhuma santa. Era flor. E flor era pra ser colhida.
Tito foi falar com Rosinha. Os dois prosearam por um bom tempo ao lado do poço, sentados na sombra do cinamomo, mascando galhinhos secos do chão. De vez em quando, a mãe dela espiava da cozinha para ver onde estavam. Conhecia Tito, permitindo, assim, a prosa. Dona Ana Guilhermina Fagundes Alves da Silveira era chamada por todos de Donana. Não sei por que esses nomes tão grandes se depois a gente chama pelos pedaços de nomes ou apelido inventado. Donana se abaixou para colocar mais lenha no fogão e, quando se levantou novamente, olhou pela janela e cadê Rosinha? Cadê Tito? Nada dos dois. Ela saiu devagar e procurou em volta da casa e nada dos dois. A roupa esvoaçando no varal. Na bacia, ainda tinha alguns lençóis para serem estendidos, e nada de Rosinha. Chamou pela guria. Chamou por Tito e nada dos dois. Entrou na casa para ver as panelas e o fogo com o coração apertado e um pouco de raiva.
Dona Nina já estava impaciente. Andando de um lado para o outro com o Cusco seguindo suas pegadas. Às vezes, quando muda a direção do andar, ela pisa em cima de sua pata ou de sua cauda. O bicho já está mancando e com a cauda em riste para escapar dos pés nervosos de Dona Nina. Mas, como todo o cachorro que se preza, não desiste, continua ali, fiel. Sete horas da noite e Tito, nada. Dona Nina já está com o jantar pronto, as galinhas já estão se recolhendo do terreiro, a Lina, vaquinha da família, já voltou para casa e Tito, nada. Dona Nina retira o avental fica um pouco na varanda olhando ao longe, mas nem sinal de Tito. Esperta como a raposa que roubou a carijó, Dona Nina lembra-se da Rosinha, guria formosinha. Aposta os ovos de uma semana inteira como ele está lá de prosa com a guria. Tira o avental da cintura e se larga praquelas bandas. O Cusco segue rápido mancando ao seu lado.
A idéia, no início, era só conversar um pouco mais à vontade. Tito convidou e Rosinha topou irem até o campo buscar o Medonho. Mas, ao chegarem ao campo, ainda era cedo e o campo estava tão verdinho, as amoras tão fresquinhas, a sanga ainda refletia a luz do sol e a conversa estava pra lá de boa. Se dependesse dos dois, eles nem se dariam conta do passar do tempo. Mas tinha o Medonho. Ele tinha que ir pra casa, senão não conseguiriam entregar o leite na manhã seguinte. Mas, naquela hora em que Tito ia pegar o bicho, ele arrebenta a corda e sai a galope assustando a guria. Tito olha para o Medonho correndo e para Rosinha com a mão na boca. Olha para a Rosinha com a mão na boca e para o Medonho correndo. Dá vontade de acalmar Rosinha, mas precisa catar o Medonho.
Tito sempre foi um guri de responsabilidade. Mas, naquela hora, até os homens de barba branca têm sua responsabilidade colocada à prova. Como negar o pedido do coração para atender a necessidade do ganha-pão? Até que rima, mas o que não rimou foi a decisão de Tito. Ele saiu em disparada atrás de Medonho e alcançou o matungo em dois tempos.
Mas e a Rosinha? Ficou atrás? Ficou foi nada! Quando viu Tito correndo atrás de Medonho, percebeu que ele era o homem de sua vida. Homem de verdade jamais iria fugir às responsabilidades de uma família. Esse era o homem que ela queria para casar. Tito pegou Medonho já no final do campo, onde estava a figueira do Enforcado.
A história de Chico Pala corria os tempos. Contavam que ele havia se enforcado por amor. Apaixonou-se por uma moça da cidade que nunca soube que Chico existia. Sempre morou sozinho. Nunca teve família. Só Chico e o seu amor não correspondido. Ficou assim por muitos anos. Tito ouviu essa história desde nascido. Um dia houve uma festança na cidade e Chico foi de gaiato, se perfumou e colocou sua melhor camisa para descobrir que a tal festa era o casamento da moça com um moço da cidade. Chico voltou para casa sem olhar para os lados. Sempre olhando para baixo, não teve dificuldade em colocar a corda por cima do galho da figueira. Encontraram Chico pendurado com um pala que cobria todo o seu corpo. Ao descerem ele do galho, descobriram que ele não vestia mais nada por baixo do pala. Ficou conhecido como Chico Pala e a figueira passou a ser chamada figueira do enforcado.
Chico Pala deixou uma casa velha onde as pessoas evitavam passar perto. Tito nunca foi dessas frescuras. Olhou para Rosinha que entendeu de pronto o que ele estava pensando. Entraram na casa. As paredes estavam cheias de frestas. O assoalho tinha buracos e os ninhos de ratos estavam por toda parte. Tito pegou a mão de Rosinha, mais por proteção, sem perceber direito o que estava fazendo. Ao se dar conta que estava de mãos dadas com Rosinha seu coração começou a pular querendo sair do peito. Sua mão e sua testa estavam úmidas de suor. Rosinha, que não era santa, era flor, percebeu o encabulo de Tito e ficou com cara de riso. Riso de alegria, pois ela também queria. Ói! Rimou de novo.
Tito entrou onde deveria ser o quarto. Só esse fato, já consumava o pecado. Os dois sozinhos dentro de um quarto. Na mente deles, eles estavam em casa. Na casa deles. Poderiam fazer o que quisessem, e foi o que fizeram. Rosinha conheceu o homem de sua vida por inteiro e Tito fez de Rosinha, sua mulher. O amor para ser descoberto por completo requer de tempo. Não pode ser às pressas, senão estraga o ato. Tito e Rosinha ficaram assim: se descobrindo de mansinho. Se pegaram no quarto do Chico Pala enquanto Medonho se fartava nas gramas verdinhas do jardim da casa do enforcado.
Dona Nina e Donana rumaram na direção do campo com o Cusco nos seus calcanhares. Donana teve que tirar as panelas do fogo para não queimar a janta. Depois teria que refazer o fogo e terminar de cozinhar. Mas quem pagaria o pato, é claro, seria Rosinha. Procuraram por toda a parte. Da porteira até o riacho. Nem sinal. Gritavam pelos nomes dos dois. Procuraram juntas e separadas para ganhar terreno, e nada. Dona Nina chorou na beira do riacho sobre a possibilidade de terem se afogado. Depois lembrou que, para nadar, Tito sempre tirava o calção. Procuraram nas margens até o rincão de cima, e nada. A noite não permitiu que elas continuassem procurando. Resolveram voltar e pedir ajuda. Ao chegarem à porteira principal, lá estava Medonho, com cara de feliz e jantado. Se medonho fosse cachorro, certamente estaria abanando a cauda, como fez Cusco ao ver Medonho vivo e sem ferimentos. Para Cusco, a busca havia terminado. Cachorro não sabe das necessidades das pessoas. Vai atrás e pronto. Cusco sabia que estavam procurando algo, enquanto elas gritavam, ele pulava em volta, querendo entrar na brincadeira de esconde-esconde. Agora que eles já acharam Medonho, é só voltar para casa. As tábuas da área da varanda, que tinham seu cheiro, o aguardavam.
Preto Abaixado, o delegado da cidade, foi avisado por Donana e reuniram-se na casa de Dona Nina. Ninguém queria alardear a notícia. Preto Abaixado era de confiança. Mas ele não poderia prosseguir na busca sozinho, precisava arrebanhar mais homens. Por exigência das mães, não mais que dois. Concordou com a quantia. Eles conheciam muito bem a região e encontrariam Tito e Rosinha em um ou dois dias. Preto Abaixado quis saber o que eles tinham feito. Nada. Foi a resposta. Não fizeram nada. Era só para descartar algum acontecido ruim. O resto as famílias resolveriam.
Na manhã seguinte, eram sete a procurar por Tito e Rosinha. Dona Nina e Medonho seguiram para a nascente do riacho com o Cusco chamando em latidos, Donana foi para a mata e Preto Abaixado com os seus ajudantes rebuscaram nas redondezas do campo. Ninguém cogitou procurar nas proximidades da figueira do enforcado, quanto mais na casa de Chico Pala. Todos pensaram, mas ninguém deu idéia. Procuraram, gritaram, chamaram, e nada. Mais uma noite chegou e Dona Nina chorava abraçada em Donana. Preto Abaixado prometeu continuar as buscas no outro dia e, se permitissem, traria mais homens.
Naquela noite, Dona Nina convidou Donana para irem até a figueira do enforcado. Donana sentiu um arrepio ao pensar que o enforcado poderia ter pegado seus filhos, ou os influenciado a se enforcarem por amor, também. Dona Nina não tinha tantos receios, mas não tinha coragem de ir sozinha até o local. Depois de muita insistência e garantia de que Cusco poderia protegê-las caso fosse necessário, Donana concordou. Chegaram à figueira às duas horas da madrugada. Tito ouviu as pegadas e pulou do chão, com as pernas bambas pela falta de alimento e pelo excesso de gozo. Saiu pé ante pé para flagrar o ladrão de almas que poderia estar com Chico Pala. Rosinha quis sair para ajudar seu herói, mas Tito fez sinal com a mão para que ficasse quieta onde estava. Em um dia de pegação com Tito, Rosinha já aprendera a obedecer. Vai dar ótima esposa. Tito ouviu as pegadas em um lado da casa e saiu pelo outro, para pegar o ladrão por trás. Juntou um porrete que estava no chão ao lado do poço de água podre. Na escuridão, Tito se aproximou do vulto e, sem perguntar, lhe aplicou um golpe certeiro no cangote – daqueles que nem Medonho agüentaria – o corpo caiu sem movimento. Tito chamou Rosinha para apreciar o ocorrido, mas a resposta veio de outro lado. “Tibúrcio Eulestério Fragato de Moraes Peixoto! O que é isso?” Tito reconheceu a voz de imediato. Não sabia se corria ou se enfrentava a fera com o porrete, mas não podia bater em sua mãe e não podia fugir deixando Rosinha para pagar pelo erro dos dois. Rosinha gelou ao ouvir aquele nome pomposo, grande como seu amor por Tito. Dá arrepio um nome desses. Rosinha saiu devagar para não ter mais surpresas, mas não evitou o grito de pavor, quando, à luz da lua, pôde ver sua mãe estendida no meio da relva abandonada, com um ferimento na nuca. Tito, então, percebeu que tinha posto a mãe de Rosinha para dormir.
Após gritar o nome completo de Tito a todo o pulmão, Dona Nina teve uma parada respiratória momentânea, levou alguns minutos para recuperar o fôlego e se calou por um bom tempo. Dona Nina mais Tito, mais Rosinha, supervisionados por Cusco, colocaram Donana em cima de Medonho e ficaram na casa dela até que ela se restabelecesse. Durante essas horas, Tito e Rosinha se olhavam com medo do que estava por vir. As mães, não disseram nada por enquanto. Talvez estivessem esperando para se recompor e atacar para valer em um golpe só. Não tinha outro jeito; tinham que esperar.
Quando Donana se recuperou, as duas se trancaram no quarto e ficaram horas proseando sobre o ocorrido. Tito e Rosinha não agüentavam de ansiedade. Quando saíram, Dona Nina pegou Tito pelo braço e o arrastou para casa sem dizer palavra. Quando Rosinha pensou em se despedir de Tito, Donana a colocou para dentro e fechou a porta segurando a guria para que ela não fosse até a janela. Cusco pulava e abanava a cauda em volta de Medonho, feliz com a família toda reunida.
Ao chegar a casa, Dona Nina foi direto para o quartinho detrás e pegou a mala velha que usava para todas as situações. Colocou as poucas peças de roupa de Tito e jogou em seu colo, sem dizer nada. Os olhos de Tito estavam secos, devido à falta de piscar, desde que saiu da casa de Rosinha. Donana fez o mesmo com Rosinha, acrescentando, em sua mala, alguns lençóis e o acolchoadinho velho que Rosinha havia ganhado de sua madrinha quando nasceu. As mães se encontraram na frente da casa de Rosinha, que ficava no caminho para o campo, onde ficava Medonho. Levaram os dois para a casa de Chico Pala e largaram o casal à sorte do Enforcado.
Do que se soube depois, nunca se teve certeza. Dizem que Dona Nina e Donana se fecharam dentro de suas casas e só saíram para serem enterradas. Morreram no mesmo dia. Suicídio.
Já viu alguém se suicidar se estrangulando, moço? Pois é, as duas mães se mataram assim. Quando as encontraram, cada uma na sua casa demorou um pouco para retirar as próprias mãos de seus pescoços. Tito e Rosinha só ficaram sabendo da morte delas vinte dias depois, quando Tito esteve na cidade, contada pelo Padre Henrique.
Lá “pras bandas” da figueira, juram ter visto Tito Rosa tratando da lavoura, acompanhado de alguém, que dizem ser Chico Pala.
Quando vai à cidade, Tito Rosa não fala com quase ninguém, tem pouquíssimos amigos e ninguém o visita em sua casa. Lá “pras bandas” da figueira, ninguém vai. E quando visitam Tito Rosa sem avisar, não voltam mais. Rosinha nunca mais foi vista na cidade. Há quem diga ter visto a guria proseando com alguém, quando Tito não está, que é Chico Pala quem cuida da casa na ausência de Tito Rosa. O filhinho dos dois ¬– é seu moço – foi o fruto dessa história toda. Mas o Padre Henrique não quis batizar, pois a criança nasceu com uma marca no pescoço que lembra marca de corda. Dizem que é Chico Pala ressuscitado.
Bem ou mal, estão vivendo a vida deles como Deus permite. Nunca me fizeram mal algum. Não estou aqui para julgar nem ser julgado.
Vai saber. O que o povo fala, se não é verdade, faz pensar. Não é mesmo, seu moço?
Bons negócios.
Fim

Quintana. Simplesmente Inesquecível

Quem Sabe um Dia (Mário Quintana)

Quem Sabe um Dia
Quem sabe um dia
Quem sabe um seremos
Quem sabe um viveremos
Quem sabe um morreremos!

Quem é que
Quem é macho
Quem é fêmea
Quem é humano, apenas!

Sabe amar
Sabe de mim e de si
Sabe de nós
Sabe ser um!

Um dia
Um mês
Um ano
Um(a) vida!

Sentir primeiro, pensar depois
Perdoar primeiro, julgar depois
Amar primeiro, educar depois
Esquecer primeiro, aprender depois

Libertar primeiro, ensinar depois
Alimentar primeiro, cantar depois

Possuir primeiro, contemplar depois
Agir primeiro, julgar depois

Navegar primeiro, aportar depois
Viver primeiro, morrer depois

Conselheiros da Cultura


Finalmente chegamos ao conselho municipal da cultura. Os conselheiros, na foto ao lado, foram eleitos sábado passado por unanimidade em chapa única criada à partir do consenso dos representantes de cada segmento artístico local. Dá-lhe Gravataí. Lição de democracia e cidadania. Obrigado a todos que contribuiram para mais esse passo. Agora contamos com a população para aproveitar todos os eventos que virão.

domingo, 29 de maio de 2011

Leitura Gratuita - Do Livro "Contos Urbanos" - 1º Conto - O Mensageiro do Coletivo




O Mensageiro do Coletivo (Capa e Ilustrações de Yuri Alves, Revisão Ortográfica de Janete Schreiber do Nascimento, Diagramação Faustino Alves Filho.)


Bancos um e dois: Duas senhoras de melhor idade conversam animadamente sobre sua agitada vida sexual.
— Meu cabelo fica todo amassado com esse vento. Meu secador quebrou e não consigo sair de casa sem lavar os cabelos.
— Sabe que eu não consigo lavar o cabelo pela manhã? O Tilôncio acorda se eu ligar o secador e fica me enchendo o saco. Aí, fico mal o dia todo.
— Nem me fala. Não consigo levantar de manhã sem fazer barulho. O meu velho também reclama do barulho do secador, que queimou. Depois de me foder a paciência a noite toda, ainda quer reclamar. Fica me agarrando para “fazer de conta” e, quando eu resolvo encarar, cadê o homem? Ainda quer reclamar do secador... Que queimou.
— Não me diga! Vou te ensinar uma simpatia. Pega as cuecas do teu velho. Tem que ser cueca usada, antes de lavar. Não pode ser suja, hein, só usada. Compra um galo vermelho. Tem que ser vermelho porque é a cor da paixão, do fogo. Veste a cueca no galo e amarra bem para não cair. Ele tem que usar a cueca por sete dias. Depois tira a cueca do galo e enterra em um local úmido onde ninguém vai pisar. É batata. Teu velho vai ficar tinindo. Faz e depois me conta o resultado. Tenho certeza que tu não vai te arrepender.
— Será?

Bancos três e quatro: Um adolescente de cabelos compridos, caídos nos olhos, baba dormindo escorado na janela. Na mão direita, uma rosa vermelha murcha e, na esquerda, o troco da passagem. Olhos de quem chorou muito.

Bancos cinco e seis: Uma senhora com uma garotinha no colo. Tudo indica que se trata de avó e netinha. A menininha está segurando um ursinho de pelúcia comprado no camelô, com uma orelha rasgada onde ela enfia o dedo e vai retirando a lã de dentro. A senhora, distraída, olha pela janela. Ao seu lado, um senhor de terno observa os movimentos da garotinha e se mantém sem expressão. A cada bucha que a garotinha retira de seu ursinho, agora com um afundamento em cima do olho esquerdo, o homem a olha nos olhos. Ela o encara com desafio. A chupeta encobre metade de seu rosto gorducho. O cabelo loiro encaracolado deixa cair uma mecha em seu olho esquerdo fazendo-a piscar sistematicamente. A senhora, percebendo o olhar do homem, abraça a menininha cruzando os braços e trazendo-a mais para si. O homem a olha com desdém e volta sua atenção para frente do coletivo.

Bancos sete e oito: Um casal discute a saúde da mulher.
— Quando será teu exame?
— Sexta.
— Está te sentindo bem?
— Estou. Só um pouco cansada.
— Eu vou pedir para sair mais cedo, para te buscar. Tua mãe vai junto. Não vai?
— Vai. Acho que lá pelas seis horas vou estar liberada.
— Certo. Vou chegar cedo. Está preocupada com o resultado?
— Até que não. Acho que a palavra certa é conformada.
— Não fala assim! Não vamos nos conformar. Seja o que for, vamos tratar, e tu vai ficar boa.
— Certo! Me engana que eu gosto. Tu sabe que não tem mais volta. Não fica tentando me fazer acreditar em algo que nem tu acredita.
— Não é assim. Quantas pessoas tu sabe que já ficaram curadas?
— Na minha situação? No estágio que essa droga está? Com o dinheiro que nós temos? Sinceramente? Nenhuma.
— Tá, tá! Mas nós vamos conseguir. Tu vai ver.
— Tudo bem. Eu sei que vai ficar tudo bem. Não te preocupa. Eu estou bem. Não vamos mais discutir sobre isso.
— Tá.
— Vai me pegar às seis?
— Vou. Quer alguma coisa?
— Quero. Me traz flores.

Bancos nove e dez: Uma jovem muito bonita olha perdidamente através da janela, segura firme, com as duas mãos, uma bolsa de tecido, muito usada e aparentemente cheia. Perdida em pensamentos.
— “... será que ele vai me aceitar? Não posso correr o risco de dar errado. Bem que mamãe me avisou. Mas, na hora do tesão, não tem jeito. Naquela hora...com aquela chuva, buscar camisinha onde? Droga de chuva, choveu na minha barriga. Encheu minha barriga. Vai ser tão bonitinho. Loirinho ou moreninho? Será que vou ser uma boa mãe? Uma coisa é certa; não vou ser igual à minha. Será que ele vai me aceitar?...”

Bancos onze e doze: Dois garotos estão aos puxões para ficar na janela.
— Me deixa ficar na janela. Tu sabe que eu vomito.
— Tu sempre quer ficar na janela. Tu não vai vomitar, porque não comeu nada antes de sair, e a mãe já te deu aquele remédio fedorento.
Do banco de trás a mãe grita para os dois,:
– Júnior! Paulinho! Fiquem quietos. Júnior! Tu não vai passar mal. Fica tranqüilo. Paulinho! Mais duas paradas e deixa teu irmão sentar na janela.
— Viu? Viu? Mais duas paradas.
— Ah, vai... !
— Uma... Duas. Me deixa sentar na janela.
— A mãe disse duas paradas, não paramos nenhuma vez. Espera as duas paradas.
— Mas já passou duas paradas! Mããããeee! Já passou duas paradas.
— Nós não paramos. A senhora disse duas paradas. Não paramos nenhuma vez. Não teve paradas. Não dou a janela.
Do banco detrás:
– Paulinho, meu filhinho querido! Se não der a janela pro teu irmãozinho, vou esconder tua roupa de cowboy e tu vai ser, a partir de hoje, o cavalo. ENTREGA A JANELA PRO TEU IRMÃO, FILHO DE UMA P... Crianças... Lindas... Dormindo.

Bancos treze e quatorze: Jovem casal, vivendo as loucuras de uma paixão recém chegada a seus corações.
— Claudinho, me deixa pôr o anel... Deixa... Deixa...
— Clara Maria, tu não estás vendo que estás a machucar o meu dedo? O anel é muito pequeno. Não dá.
— Dá, sim. Claro que dá. Deixa, deixa, deixa.
— Amorzinho, olha só! O teu dedinho é um mimo, coisa mais fofinha. Mas o meu dedo é grosso, olha só! Não dá, não cabe.
— Claudinho, eu ganhei esse anel do meu bisavô, mas é de homem. O coitado do velhinho não sabe mais diferenciar o que é de homem ou de mulher. Ele nem sabe mais o que é mulher. Por isso quero te dar... O anel. Não vou jogar fora ou entregar para outra pessoa. Deixa eu colocar no teu dedo! Deixa! Deixa! Deixa!
— Porra, mulher! Já te falei que não dá. Olha aqui, ó, tá vendo? Não entra, não dá, não dá. Vou jogar essa merda pela janela se tu não parar!
— Claudinho! É do meu Biso. Snif, snif, snif.
— Ai, meu saco! Dá isso aqui.
—... Não, no mindinho não vale.
— Clara Maria, Clara Maria, não me faz te arrebentar! Pega isso de volta.
—...
— Claudinho?
— O quê?
— Me deixa colocar o anel! Deixa! Deixa! Deixa!

Bancos quinze e dezesseis: Mãe dos dois garotos do banco onze e doze.

Bancos dezessete e dezoito: Dois rapazes voltam do trabalho e comentam a festa de despedida do chefe.
—Tu viu a mulher dele?
— Aquilo era mulher? Pensei que era uma tsunami.
— Cara, que coisa mais feia!
— Bah! Nem me fala. E a calça dela? Atolada até o útero.
— Pensa que é gostosa.
— Pior, pensa que é gatinha.
— E a filha?
— Bah! A filha é muito da gostosa.
— Nem me fala. Acho que ela me deu bandeira.
— Ah! Pára! Nem que tu fosse o último homem da terra. Aquilo é mulher para outra classe.
— É, né? Acho que me enganei. Também. Eu já tava tortinho.
— Tu ainda tá tortinho.
— É, né?
— Não vai perder a hora amanhã, né?
— Não vou, não. A mãe me acorda. Pra onde ele vai?
— Quem?
— O chefe.
— Ah. Não sei.
— Ãh-hã! Mas que filha.
— É.
— Vou dormir.
— Tá.


Bancos dezenove e vinte: Um casal de uma classe social um tanto elevada para o local onde estão conversam naturalmente.
— Eu vou descer na clínica e, mais tarde, pego um táxi até a natação do Tadeu. Vou chegar um pouco atrasado para a reunião, mas tudo bem.
— Eu não vou te perdoar nunca, Moacir Claudionor. Onde já se viu deixar o carro estragar justo agora que o meu está na revisão! Tem que manter ao menos um funcionando, né?
— Pára de reclamar, Helena Joaquina. Não se deixa algo estragar. Simplesmente estragam. E, depois, que mal tem em pegarmos ônibus uma vez na vida?
— É isso mesmo, uma vez na vida, pois, se tiver outra vez, tu não entra vivo nele. Por que não fomos de táxi?
— Porque eu quero ver pessoas diferentes. Quero sentir o que acontece na nossa volta. Quero saber o que está se conversando publicamente.
— Vou te dizer uma coisa, Moacir Claudionor! Essa tua mania de ser socialmente correto está acabando com a gente. Onde já se viu? Dar um rancho para o jardineiro! Ele nem pediu, talvez até se ofenda. Já pagamos um salário muito alto para ele. Não tem que dar essas regalias.
— Vou aumentar o salário dele.
— O quê? Pára o mundo. Pára o mundo, que eu quero descer. Meu marido enlouqueceu. Ele quer consertar todas as injustiças do mundo.
— Não exagere Helena Joaquina. Não estou fazendo nada de mais.
— Não, não está fazendo nada demais. Já deu o Gringo para o vizinho.
— O Gringo era um buldogue caduco. Só servia para fazer buracos.
— Mas custou caro, muito caro. Ainda foi enrolado no meu cobertor de pele de lontra, importado. E o Nestor, então?
— O Nestor não foi tão caro. O menino tinha acabado de perder seu papagaio. Fiquei comovido.
— Mas o Nestor é um periquito.
— Da Austrália.
— Então? Não é papagaio.
— É como se fosse.
— Moacir Claudionor, de quem foi a idéia de entregar ao pedinte da terça todos os ternos de linho que estavam no armário 15?
— A idéia foi do Tadeu. Com todo o meu apoio. Impus a ele que só ganharia o carro novo no final do ano se fizesse uma boa ação. Ele então sugeriu dar meus casacos. Eu já não usava mais mesmo. E ele fez melhor. Acertou com o pedinte da segunda para vir mais cedo. Assim pode pegar o que a Claudinete joga fora, das sobras do “findi”. Esse guri vai longe.
— Moacir Claudionor... Ainda acabo contigo.

Bancos vinte e um e vinte e dois: Abraçado a uma guitarra que está com duas cordas arrebentadas: a segunda e a quarta. Descansa a cabeça no braço do instrumento um jovem músico. Pelas roupas, aparenta ter saído de um show de punk-rock. Tênis com os cadarços abertos e aparentando ser o único tênis usado nos últimos anos. O cabelo nos olhos encobre metade do rosto e não lhe deixa ver o que está à sua volta. Pensativo, olha para o chão, contando as listas antiderrapantes do piso.

Bancos vinte e três e vinte e quatro: Dois amigos conversam animadamente sobre coisas da vida.
—... E o teu time?
— Não quero saber.
— Eh! Que é que há? Só perguntei.
— É! Pois não devia ter perguntado.
— Tá bom. Eu sei que estão mal. Mas não é pra tanto.
— Dá para parar de falar? Não quero conversar sobre futebol hoje.
— Tudo bem, tudo bem... Soube o que aconteceu com o padre Fúlvio? Pegaram ele com umas guriazinhas atrás da Igreja.
— Pra que falar do Padre? Tu não vivia defendendo o Padre? Tu não era amigão dele? Pra que ficar falando dele agora que descobriram um monte de podre do coitado?
— Poxa, mas tu tá demais, hoje, hein? Certo. Tu tem razão. Não vamos chutar cachorro morto. Quem me falou foi dona Nilza. A Janete, vizinha dela, era uma das gurias. E, cá pra nós, aquela guria é muito gostosinha. Eta Padre de bom gosto!
— Vem cá. Tu tá com problema de ouvido? Precisa ir ao médico. Eu acabei de falar que não quero falar sobre isso. O que tu tá querendo? Me irritar? É isso? Quer me irritar?
— Calma, calma. Não vou mais falar do Padre. Nem conheço Padre nenhum mesmo. Pode deixar... Nada.
— Tá bom! Não vamos brigar por causa disso. Só quero ficar quieto.
—...
—...
— Sabe quem bateu lá em casa ontem? O vereador...
— Pára! Pára! Pode parar. Política. Política, não!
— Tá bom, tá bom! Vou sentar lá atrás. Que coisa!

Bancos vinte e cinco e vinte e seis: Duas mulheres jovens, bem arrumadas, desconhecidas, no mais absoluto silêncio. Uma olha fixamente para frente do corredor e a outra mantém o rosto virado para a janela. Subiram juntas na mesma parada e sentaram no mesmo instante. Mantêm seu silêncio desde que subiram.

Bancos vinte e sete e vinte e oito: Uma senhora conversa com um senhor sobre os acontecimentos que antecederam sua entrada no coletivo.
— O senhor não imagina o que me aconteceu agora há pouco!
— É! Não imagino. O que aconteceu?
— Dois moleques não tentaram me assaltar? Dois moleques. Acho que tinham menos de quinze anos. O senhor não acha uma barbaridade isso?
— É! Não acho. A senhora ficou bem? Eles conseguiram levar algo?
— Não. Claro que não. Imagina se eu vou deixar dois pirralhos me passarem a perna. Nunca. Dei uns tapas e eles saíram correndo. O senhor não acha que fiz certo?
— É! Não acho. Eles estavam armados?
— Ah! Mas o senhor não conhece esses moleques de gangue mesmo!
— É! Não conheço.
— Eles chegam azucrinando e ganham só na gritaria. Começam a gritar que é um assalto e contam com o susto da vítima. Até a gente perceber que são umas crianças desarmadas que estão nos roubando, já nos arrancaram a bolsa e foram embora.
— Foi assim que lhe atacaram?
— Já me roubaram assim uma vez. Mas não me pegam mais. Boto todo mundo pra correr. O senhor nunca foi assaltado?
— É! Não fui. Quem sabe um dia.

Bancos vinte e nove e trinta: Um dos amigos do banco vinte e três e vinte e quatro.

Bancos trinta e um e trinta e dois: Um velho está sentado com o corpo inclinado para frente, apoiado com as duas mãos em uma bengala de bambu, usa um chapéu de palha com as abas corroídas pelo tempo e mostra, através dos visíveis calos das mãos, que se trata de um trabalhador do campo. Com sua vida desgastada pela labuta, está indo ao hospital central para visitar sua filha que esteve doente por muito tempo e, devido à colheita que não podia atrasar, ele não pôde vê-la nenhuma vez. Estava apreensivo, sem saber como ela estava de saúde.

Bancos trinta e três e trinta e quatro: No lugar dos bancos trinta e três e trinta e quatro, somente as marcas no chão. Os furos onde estavam os parafusos dos bancos, deixam ver o asfalto que passa veloz por entre as rodas de pneus carecas.

Bancos trinta e cinco e trinta e seis: Vazios.

Bancos trinta e sete e trinta e oito: Duas freiras rezam concentradas.
O coletivo está a cinco paradas do convento onde as freiras que estão rezando irão descer. As orações são para todos que estão no ônibus e fora dele. Mas, principalmente, para o motorista. Afinal de contas, nossas vidas estão em suas mãos. Ele é mais um dos incontáveis deuses que surgem em nosso dia-a-dia.
— Desce! — grita o cobrador.
— Sobe! — grita o cobrador. — Um passinho à frente faz favor.

Um homem maltrapilho pára na roleta e mexe nos bolsos. O cobrador olha curioso para o sujeito.
— Um passinho à frente, faz favor.
A frase sai automática. Ele nem precisa pensar no que vai dizer. Sempre que chega alguém à sua frente, dispara um gatilho e a frase sai sozinha. ¬“Um passinho à frente, faz favor.”.
O homem continua mexendo nos bolsos e retira vários papéis, algumas fotos e alguns objetos em papel amassado de embrulhar pão. Mas dinheiro não aparece. Olha com olhos de medo para o cobrador. Medo de passar vergonha. De ser repreendido em voz alta. Medo de que todos saibam que sua pobreza é maior do que aparenta. Se é que isso é possível.
— Eu estou sem trocado.
— E agora? O que o senhor quer que eu faça? Se o senhor não pagar, eu tenho que pagar. Sai do meu bolso.
— Posso ficar aqui atrás? Assim o senhor não terá prejuízo.
— E se o fiscal sobe? Como eu fico? Perco meu emprego.
— Entendo. Vou descer, então!
Quando disse isso, o homem passou os olhos pelos olhos do cobrador, que até então falava remexendo nas gavetas. Por um instante, o cobrador pensou ter visto os olhos de seu pai, que não via há quinze anos. A última vez que conversaram eles quebraram os pratos. Ele foi embora acusando seu pai de ter fraudado sua pequena empresa e levado toda sua família à ruína. Depois de cinco anos, descobriu que estava errado. Procurou seu pai por algum tempo, sem sucesso, e desistiu. Não, aquele senhor não tinha nada a ver com seu pai, mas seus olhos...
— Senhor!
— Pois não!
— Pode passar.
— Mas e o seu emprego?
— Não se preocupe. Mas não pense que sou bonzinho. Não vou facilitar da próxima vez.
— Tudo bem. O senhor será recompensado.
— É! Tô sabendo.
O homem passou pela roleta e parou diante das freiras dos bancos trinta e sete e trinta e oito. Elas o olharam com certo nojo, pela sujeira e pelas roupas rasgadas que usava. Nem mesmo seus olhos tristes foram capazes de arrancar um olhar mais fraterno delas. Ele retirou uma pequena cruz de madeira do bolso e estendeu a mão para entregar a elas. A mais nova olhou para a mais velha em incógnita, sem saber o que fazer. A mais velha olhou para os pés do homem, que usava chinelos de dedos, e acenou com a cabeça para que sua colega pegasse a cruz. Quando tocou a pequena cruz, a freira sentiu um arrepio percorrer seu corpo e subitamente uma sensação de bem-estar se apossou das duas.
Uma senhora que estava na calçada alguns metros à frente do ônibus, com uma criança pela mão, se descuidou e a criança correu para atravessar a rua. O motorista freou bruscamente o ônibus, sacudindo todos os passageiros em seus lugares e o desviou para fora da estrada na tentativa de evitar o atropelamento. Subitamente, um brilho muito forte surgiu na frente do coletivo, como se o ônibus tivesse caído em um mar de luzes ou, talvez, algo tivesse explodido lá fora. O homem maltrapilho tentou se segurar, mas cambaleou e enganchou o pé nos parafusos dos bancos trinta e três e trinta e quatro, e um de seus chinelos de dedos escapou de seu pé, deslizando pelo corredor. O homem sentou-se obrigatoriamente ao lado do velho dos bancos trinta e um e trinta e dois. Seu chinelo chamou a atenção de todos os passageiros que, agora, estão agitados pela freada.
Ao passar pelos bancos vinte e nove e trinta, um dos amigos acompanhou o chinelo com os olhos por um tempo. Levantou os olhos ao perceber que estava na direção dos bancos vinte e três e vinte e quatro, onde estava seu outro amigo. Os dois acharam graça do chinelo deslizando pelo corredor do ônibus e trocaram um sorriso. O amigo dos bancos vinte e nove e trinta levantou-se e sentou-se novamente ao lado do amigo dos bancos vinte e três e vinte e quatro.
— Vamos ao Grenal domingo?
— Só se for meio tempo em cada torcida.
— Fechado.
O homem olhou o velho dos bancos trinta e um e trinta e dois nos olhos e este sorriu amigavelmente.
— Sua filha está bem.
Falou o homem colocando a mão sobre o ombro do velho, que teve certeza, sem saber por que, que o homem estava falando a verdade. Sentiu muita paz em seu coração.
O chinelo desliza e pára em frente ao banco vinte e cinco e vinte e seis. As duas senhoras olham no mesmo instante para o chinelo e começam a dar risadas a todo o pulmão. Sem entender muito bem o motivo, olham-se e dão gostosas gargalhadas.
Mais um solavanco e o chinelo desliza novamente parando em frente ao banco vinte e um e vinte e dois. O rapaz que está sentado olha o chinelo demoradamente, então se abaixa e o pega. Ao se levantar, percebe que o homem maltrapilho está ao seu lado. Ele estende a mão e entrega o chinelo ao homem que, em agradecimento, lhe dá um forte e demorado abraço.
— Muito obrigado.
O rapaz sentiu uma força estranha em seu peito. O homem lhe entregou um pequeno pacote. Algo embrulhado em papel muito amassado. O rapaz se espanta com a beleza e o brilho da pequena palheta azul. Parecia vidro. Toca em sua guitarra, nas cordas que sobraram, e percebe uma melodia totalmente nova. O restante da música lhe vem à cabeça, mas ele precisa do grupo todo para ensaiar. Fica tomado por uma enorme felicidade ao imaginar a alegria de sua mãe, que acreditava muito em seu sucesso e pagava caro para sustentá-lo até que ele lhe pudesse retribuir, ao ouvir tal canção.
— Tua mãe sente muito orgulho de ti. As coisas nem sempre acontecem pelos caminhos que gostaríamos, mas acontecem. Fica tranqüilo.
O homem larga o chinelo no chão e levanta a perna calmamente para calçá-lo. Porém, antes de colocar o pé no chinelo, mais uma freada faz o chinelo correr novamente e parar em frente ao casal dos bancos dezenove e vinte. O homem se aproxima calmamente enquanto o casal fica a observá-lo. Antes de pegar o chinelo, o homem olha fixamente para a mulher e estende o braço em sua direção.
— A senhora tem uma moeda?
A mulher está com medo. Não sabe por quê. Nem entende a falta de reação de seu marido. Sente um medo inexplicável. Vontade de sair correndo, mas, ao mesmo tempo, o olhar daquele homem é irresistível, não dá para fugir, não dá para negar. Sem tirar os olhos daquele mendigo, retira algumas moedas da bolsa e larga na mão espalmada do homem, que agradece com um aceno de cabeça e sorri. O homem continua tentando pegar seu chinelo, enquanto a mulher desaba em um choro convulsivo. O marido, que não entende nada do que estava acontecendo, não consegue dizer palavra. Ela simplesmente chora feito criança, lágrimas de esvaziar a alma.
Um chinelo sujo, faltando um pedaço no calcanhar devido ao longo tempo de uso, corre no corredor para lá e para cá. As pessoas não conseguem tirar os olhos do chinelo ou de seu dono, que anda pelo corredor do ônibus tentando buscar seu pé de calçado.
O chinelo pára diante da senhora dos bancos quinze e dezesseis, e o homem senta-se ao lado da mãe dos garotinhos. Os dois garotos dos bancos onze e doze olham-se, fazem uma careta engraçada e começam a rir baixinho. A mulher se espreme na parede do ônibus para evitar contato com as roupas sujas do homem. Ele lhe sorri. Um sorriso manso, inocente, a deixa em dúvida devido à tamanha simpatia. Sente que aquele homem pode ser bom, generoso, perde a vontade que estava de se afastar e lhe arrisca um sorriso amarelo. O homem retira do bolso duas pedrinhas. Uma azul e uma verde. Entrega para a mulher e lhe explica que a azul deve ser entregue ao Júnior e a verde para Paulinho. Ao descerem, eles deveriam lhe entregar as pedrinhas de volta e ela deveria guardá-las até que alguém lhe pedisse as pedras. Elas eram a senha para o acesso em algum lugar.
— A senhora ainda vai entender a beleza de ser criança e, embora esteja muito triste, a senhora será recompensada no final com a felicidade do entendimento.
Disse isso e se levantou em busca do seu chinelo. A mulher ficou muda observando aquele homem, mendigo, pensando nas suas palavras que cravaram em seu cérebro como uma lâmina eterna que, ela sabia, não sairia mais dali.
O homem senta ao lado da jovem do banco nove e dez. Ela lhe sorri em cumprimento. Ele olha para a altura de seu ventre e pega sua mão entre as dele. A moça não está com medo, nem com nojo. Sente apenas uma calma gostosa. Paz. Muita paz.
— Aquele rapaz está precisando de sua ajuda. Ele também quer lhe contar um segredo.
O homem falou apontando com a cabeça para o banco três e quatro. A moça lhe sorriu novamente concordando com a cabeça. Olhou na direção do jovem indicado, mas só conseguiu enxergar os cabelos do jovem que dormia escorado na janela. O homem levantou-se e ficou olhando para a moça, como a esperar que ela fosse até o jovem. Ela entendeu e dirigiu-se até o banco três e quatro.
— Com licença, posso sentar?
A moça perguntou ao rapaz, que a olhou por baixo dos cabelos e se ajeitou no canto do banco abrindo espaço para que a moça pudesse sentar-se.
Ele fica observando a moça durante algum tempo e um sentimento forte invade seu peito. Sente que precisa falar com ela, abraçá-la. Já não importa mais a traição que sofreu há pouco. Não pensaria mais em vingança. Estende a mão e lhe oferece a rosa que, para seu espanto, agora está de um vermelho radiante, brilhando em forte vida, como seus corações.
O homem parou diante do banco sete e oito e ficou observando o casal que estava em silêncio, olhando para fora. A mulher percebeu a presença do homem e cutucou o marido com o cotovelo. O homem se curvou um pouco mais e falou para a mulher:
— A vida lhe deu um presente que a senhora soube cuidar muito bem durante dezessete anos. Agora, as coisas mudaram. Não fique triste. Tudo será como deve ser. As pessoas sempre se lembrarão daqueles que lhes fizeram o bem. Por toda a eternidade.
Dito isso, se afastou.
— Quem é? Tu conhece esse cara? —perguntou o marido.
— Não, claro que não. Cada um que me aparece!
A mulher ficou pensativa olhando pela janela. O marido curvou-se para enxergar seus lábios, onde jurou ver um sorriso bobo. A mulher disfarçou, mas seus olhos não mentiam. Algo mudou dentro dela.
O homem se aproximou do banco cinco e seis e o sujeito de terno levanta a cabeça para ver quem estava ao seu lado. Subitamente começa a tremer, seu rosto perde a cor e suas mãos não se firmam por mais que ele se esforce em segurá-las entre os joelhos. Ele levanta a cabeça como a pedir ajuda ao homem que acabara de chegar, mas seu rosto fica sério ao ver a expressão do maltrapilho. Em toda a sua serenidade, ele transmitiu algo ameaçador ao homem sentado. O homem do terno se levanta, pede licença, mas, antes de ter uma resposta, empurra o mendigo para trás e sai correndo em direção à porta da frente. Grita com o motorista para que pare o coletivo. O motorista não quis parar fora do ponto, deixando o homem muito mais nervoso. Ele se agarra no banco do motorista e começa a sacudir violentamente, olhando a todo momento para trás para ver onde o mendigo estava, obrigando o motorista a parar. A porta se abre e ele salta na calçada. De dentro do ônibus, percebe-se o suor a escorrer por sua testa. O homem tropeça a cada três passos e segue seu caminho, assim, cambaleando sobre uma neblina que, agora, cobre a calçada, não permitindo que vejam seus pés. Ouvem-se pequenos sons de cascos.
O maltrapilho senta ao lado da mulher e a garotinha lhe estende a mão oferecendo o ursinho com um buraco na orelha. O homem empurra alguns chumaços de lã que estavam caindo da orelha do ursinho e alisa a cabeça de pelúcia. A garotinha sorri abertamente deixando a chupeta cair e revelando dois dentões na gengiva de cima. A mulher observa o homem sem saber o que dizer. Este se levanta e pega seu chinelo que está ao lado, coloca no pé e olha curioso para o banco um e dois.
— As senhoras viajam sempre juntas, não?
— Sim, quase sempre.
— Os amigos são partes de nós, nos acompanham sempre, até quando não estão mais aqui. Boa viagem!
O motorista olha o estranho passageiro e sorri com cumplicidade. O homem maltrapilho fica em pé nos degraus da porta, aguardando o ônibus parar. As pessoas estão todas em silêncio. Na parte de trás da cabeça do mendigo, surge a ponta de um tecido branco, alvo, que estaria em baixo de sua roupa suja. Seu cabelo visto detrás, não parece mais tão sujo. O homem volta-se e olha para dentro do coletivo. Seus olhos azuis roubam toda a atenção devido à forte luz que, aparentemente, sai deles.
O ônibus pára e ele desce. Acena para o motorista, que, ao acenar de volta, deixa aparente sua manga larga e algumas pontas de penas descem por sua roupa. Todos os passageiros percebem. Alguns se olham e sorriem, outros enchem os olhos d’água, mas se resignam. As senhoras olham-se e trocam um sorriso calmo, de quem sabe onde está e que está seguro, por toda a eternidade.

Fim

domingo, 22 de maio de 2011

É HORA DA ARTE LIVRE

Uma iniciativa de alunos e ex-alunos da Krapok.


SketchCrawlPOA
Movimento cultural mundial, o SketchCrawl é uma iniciativa livre, gratuita, sem regras nem burocracias. Só é preciso a vontade de se reunir, sair pra rua e retratar tudo que desperta nosso interesse e imaginação. Não é competição e não julga o nível de habilidade artística de ninguém.
É apenas um motivo para desenhar pelo prazer de desenhar. Traga o seu material.
Data: 29 de maio de 2011 - 15horas - na Usina do Gasômetro
Incrições no link: http://www.facebook.com/event.php?eid=148018995267499
Mais informações no blog: http://www.sketchcrawlpoa.tumblr.com/
Apoio: Krapok Escola de Arte - http://www.krapok.com.br/

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Alfabeto do Amigo

Aceita você do jeito que você é.
Bota fé em você.
Chama ao telefone só pra dizer "oi".
Dá amor incondicional.
Ensina-lhe o que sabe de bom.
Fica contigo quando você não está legal.
Grava na memória só os bons momentos.
Humor não lhe falta para lhe fazer sorrir.
Interpreta com bondade tudo o que você diz.
Jamais o julga, esteja você certo ou errado.
Livra-o da solidão.
Manda-lhe pensamentos de ternura e gratidão.
Nunca o deixa em abandono.
Oferece ajuda quando vê sua necessidade.
Perdoa e compreende as suas falhas.
Quer vê-lo sempre feliz.
Ri com você e chora quando você chora.
Sempre se faz presente nos momentos de aflição.
Toma suas dores e evita que o maltratem.
Um sorriso seu basta para fazê-lo sorrir.
Vai com você a qualquer lugar.
Xinga se for preciso e briga por você.
Zela, enfim, pela jóia que você lhe

Artista Local Também é Bom.

A Arte de gravataí precisa de apoio. Temos muitos artistas em Gravataí de nível internacional. Artistas Plásticos que já expuseram seus trabalhos no exterior, Músicos que tocam em vários estados e países e residem em Gravataí e que muitas vezes não se apresentam aqui por falta da público. O mesmo público que vai à Porto Alegre pagar para assistir, muitas vezes, o que temos de graça aqui no SESC. O pessoal do Teatro sabe muito bem o que é isso, mas têm se destacado graças ao seu talento, mas que também merecem mais atenção. Todas as Artes estão muito bem representada em nossa cidade, mas não são apreciadas como deveriam, tendo que se destacar em outras localidades. Está mais do que na hora de virarmos o jogo, como Artistas e como público. Convoco a todos a participarem do eventos culturais de nossa cidade. Artista valorizando Artista e levando seu público com ele. Vamos aproveitar o que temos de bom e fazer nosso lazer em nosso quintal. Chamo a todos para repensarem seus critérios e verem de perto a verdade que estou dizendo. Um grande abraço a todos e até o próximo evento, de qualquer seguimento. Muito obrigado

sábado, 14 de maio de 2011

Frase do Ano

"A estupidez é infinitamente mais interessante que a inteligência. A inteligência tem limites, mas a estupidez, não".
Claude Chabrol

Esposição de Zélia Marangoni


Vamos prestigiar a arte de Gravataí. Conto com vocês.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Quiosque da Cultura


As obras da reforma do Quiosque da Cultura, localizado na Praça Leonel Brizola, foram apresentadas pela Prefeitura aos representantes da sociedade civil e do governo que integram o conselho consultivo da Fundação de Arte e Cultura (Fundarc), na tarde desta quarta-feira (27/04). O objetivo do encontro foi realizar a prestação de contas e colher sugestões para a obra do prédio que está sendo transformado em um centro cultural.

De acordo com o presidente da Fundarc, Amon Costa, a obra será realizada em três etapas, sendo que mais de 80% da primeira etapa já está concluída, e em breve, será aberto edital para contratação da empresa responsável pela segunda etapa da construção. Amon disse também que está recebendo sugestões da comunidade para a organização e decoração interna do espaço. "Estamos investindo cerca de R$ 130 mil na primeira etapa e aplicaremos entre R$ 200 a 250 mil na segunda fase. Projetamos finalizar e celebrar a inauguração deste prédio, que abrigará a cultura da cidade e será um ponto de encontro da população, até o final do ano", afirmou.

Amon Costa citou que após a desapropriação do prédio, a atual gestão iniciou em 2009 o projeto para a melhor utilização do espaço, buscando a valorização da diversidade cultural do município. Conforme o planejamento, o prédio contará com a acessibilidade universal, priorizada pela administração municipal, com a instalação de rampas, de elevadores, além de banheiros adaptados. No segundo piso, será construído um auditório para 300 pessoas e haverá local para comercialização de produtos alimentícios, com abertura de edital para empresas interessadas. "A nossa proposta é dialogar com a variedade de manifestações e segmentos culturais da cidade, proporcionando simultaneamente múltiplas atividades neste local que já é uma referência no Centro de Gravataí", enfatizou.

Fortalecimento da cultura
Os representantes do conselho observaram a reforma que prevê os seguintes espaços no local: mini palco, parte administrativa, ambiente gastronômico com área de lazer, espaço para exposições de arte, fotografias e saraus do clube literário. Durante o período da obra, estão em exposição nos tapumes as obras dos artistas da Associação dos Artistas Visuais de Gravataí (Agir). Para o atual presidente da Associação e do Conselho Consultivo da Fundarc, Waldemar Max, a cultura do município será fortalecida com um espaço adequado e de fácil acesso para as atividades. "É muito importante contar com um prédio central para os artistas e entidades que promovem cultura em Gravataí, pois cito como exemplo a exposição que a Agir realizou aqui no Quiosque no ano passado e que recebeu mais de 700 visitantes", frisou Max.

"Essa obra do Quiosque é magnífica, pois finalmente a cultura do município terá uma referência que abrigará as diversas manifestações culturais existentes na cidade. Quem faz e participa da cultura compreende a importância que ela tem para o ser humano", afirmou a presidente do Clube Literário de Gravataí, Maria Izabel Moreira.

Já os representantes do Movimento Hip-Hop, Daniel DKG e Big Jhon e o assessor de Políticas Públicas para a Juventude, Marcos Alexandre da Cruz, o Marck B, salientaram que o novo centro cultural poderá ser utilizado para socializar atividades realizadas nos bairros e promover a integração entre os diferentes movimentos e associações do município. “Pelo que verificamos hoje, acredito que o Quiosque da Cultura será uma referência nacional na área”, ressaltou o assessor. Fundação de Arte e Cultura
Fone: (51) 3484-6681

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Arte em Xeque

A abertura da exposição Arte em Xeque estava muito boa. Muita gente conhecida das artes visuais. Na próxima espero encontrar mais gente conhecida de Gravataí. Precisamos nos colocar mais nesse meio. Até a próxima.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Exposição "Camuflagem"

Chegou o dia do encerramento da exposição "Camuflagem" que aconteceu no Hall de Entrada da ULBRA nos últimos dias. Foram muitas visitas e grandes elogios anotados no livro de presença. Agradeço emocionado as palavras de incentivo e consideração que ficaram registradas no livro. Levo com muito orgulho para meu currículo mais esse evento que a ULBRA juntamente com a AGIR, grande parceira, me proporcionou. Muito obrigado a todos que se fizeram presentes durante a exposição e àqueles que não puderam comparecer, fica a certeza de que terão outra oportunidade de admirar e adquirir meus trabalhos que trazem algo de novo para a arte de Gravataí. Mais uma vez, muito obrigado e até a próxima.

Faustino Alves Filho

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Crianças da Favela



Esse é meu trabalho que estará exposto no Atelier Plano B "Arte em Xeque", Até lá.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

IV Convocatória de Arte Atelier Plano B

Exposição de 27 de Abril a 20 de Maio de 2011, com abertura em 26 de Abril às 20 hs. Apareçam.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Obrigado Cesar Romão

Cesar Romão retirou centenas de meninos de rua do Rio de Janeiro e inclui-os na folha de pagamento de sua metalúrgica lhes ensinando uma profissão e dando-lhes uma chance de viver dignamente. Hoje, 30 anos depois, muitas famílias agradecem por ter um lar e um pai que podem se orgulhar por ter renascido e se tornado novamente uma pessoa de bem. Uma pessoa assim, como Cesar Romão, deve ser eternamente lembrado.

"A circunstância de nascimento ou de vida de uma pessoa não determina como ela deve ser no final. Essa determinação é feita pela confiança que se tem de si próprio". (Cesar Romão)
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."Somos o que somos porque vivemos onde vivemos e sabemos aquilo que aprendemos. Se você viveu até hoje tentando abraçar Deus e não conseguiu, abrace quem estiver ao seu lado, é a mesma coisa". (Cesar Romão)

segunda-feira, 21 de março de 2011

Vivendo a Cidade


Exposição Coletiva "Vivendo a Cidade" no Foyer do Teatro do SESC de Gravataí. Muitos artistas locais estarão lá em 07/04 às 20h.Inclusive nós, da AGIR. Apareçam, será um ótimo divertimento.

domingo, 20 de março de 2011

EXPOSIÇÃO VISUAL "CAMUFLAGEM"


PRESTIGIEM MAIS ESSE ESPAÇO QUE A ULBRA GRAVATAÍ ESTÁ NOS DISPONIBILIZANDO. O HALL DE ENTRADA FICA POVOADO DE ARTES DE VÁRIOS GÊNEROS EM EXPOSIÇÕES MUITO BEM COLOCADAS. ESSA É A MINHA VEZ. CONTO COM TODOS LÁ. UM GRANDE ABRAÇO.

sábado, 19 de março de 2011

Sarau do Clube Literário


O Sarau do Clube Literário de Gravataí acontece no segundo sábado de cada mês no SESC Gravataí. É uma atividade para toda a família e todos podem participar com qualquer atividade cultural.

Romance.


Um romance com muito bom humor e fortes críticas sobre os preconceitos que nos machucam o peito. Muito agradável de ser lido. Uma história de pessoas simples como nós vivendo uma vida cheia de emoções e com muitos motivos para sorrir e seguir em frente.

Contos Urbanos


Um livro para "adolescentes" de todas as idades. Seis contos atualizados com os acontecimentos de nossas vidas, contam com muito bom humor, histórias que, com certeza, já foi vivida por alguém que você conhece ou por você mesmo. O amor na pureza da idade do sentimento sem maldade.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Poema erótico

Carlos Drummond de Andrade



'Satânico é meu pensamento a teu respeito, e ardente é o meu desejo de apertar-te em minha mão, numa sede de vingança incontestável pelo que me fizeste ontem.
A noite era quente e calma e eu estava em minha cama, quando, sorrateiramente, te aproximaste. Encostaste o teu corpo sem roupa no meu corpo nu, sem o mínimo pudor! Percebendo minha aparente indiferença, aconchegaste-te a mim e mordeste-me sem escrúpulos. Até nos mais íntimos lugares. Eu adormeci.
Hoje quando acordei, procurei-te numa ânsia ardente, mas em vão. Deixaste em meu corpo e no lençol provas irrefutáveis do que entre nós ocorreu durante a noite.
Esta noite recolho-me mais cedo, para na mesma cama te esperar. Quando chegares, quero te agarrar com avidez e força.Quero te apertar com todas as forças de minhas mãos. Só descansarei quando vir sair o sangue quente do teu corpo.
Só assim, livrar-me-ei de ti, mosquito Filho da Puta! '